No Estadão, aos seis meses de profissão

Cláudio Amaral

Ingressei na equipe de correspondentes do Estadão com apenas seis meses de profissão.

Eu havia me tornado jornalista profissional, de fato, no dia 6 de janeiro de 1969, a partir de quando passei a viver por minha conta a risco e com recursos próprios.

Havia viajado de Adamantina, minha cidade natal, a cerca de 600 quilômetros da Capital paulista, para Marília, distante 450 quilômetros de São Paulo, no dia 5 de janeiro de 1969.

Viajei de trem, numa composição da Companhia Paulista de Estradas de Ferro, posteriormente absorvida pela Fepasa (Ferrovias Paulistas S/A).

Até então, eu vivia na casa de papai e mamãe. Sim, eu tinha o meu próprio dinheiro, mas quem sustentava a família (meus pais, meu irmão e minha irmã caçula) era meu pai.

Ao sair de Adamantina, no dia 5 de janeiro de 1969, eu deixei de ter meu sustento garantido pelo ‘seu’ Lazinho (Lázaro Alves do Amaral).

Voltava para casa dos meus pais quase todo sábado, sempre de trem. E, como a maioria dos jovens da minha idade e na minha condição, levava a roupa suja para dona Wanda lavar e passar.

Aos poucos, as viagens para Adamantina foram diminuindo e praticamente acabaram quando conheci a Sueli (mas isso é tema para outro texto e outra publicação).

O importante é que na metade de 1969 apareceu em Marília um enviado especial do Estadão, o jornalista Paulo Stipp Júnior. Ele morava em Taubaté e era correspondente no Vale do Paraíba. O pai dele, Paulo Stipp, médico, havia morado em Marília e lá ainda tinha uma casa. Com a morte do Dr. Stipp, o Júnior foi a Marília para vender a casa, fazer algumas reportagens para o Estadão e de quebra selecionar um correspondente local.

Levava no bolso do colete o nome de um dos jovens jornalistas de maior fama na região, na época: José Cláudio Bravos. Mas, quando ele chegou à sede do Jornal do Comércio em busca do proprietário, Irigino Camargo, que havia sido amigo do Dr. Stipp, Júnior ouvi do meu primeiro e inesquecível Mestre: “O correspondente certo para o Estadão está aqui”. Dito isto, Irigino me chamou e me apresentou a Stipp Júnior.

Atravessamos a rua, sentamos numa mesa de bar, tomamos refrigerante (ele bebeu guaraná Antarctica e eu, Fanta Laranja) e conversamos por três horas a respeito do Estadão, das atividades e responsabilidade de um correspondente, detalhes e mais detalhes.

Ao final da conversa, Stipp me convidou para acompanhá-lo numa reportagem no Hospital das Clinicas de Marília. Fui e vi como ele se apresentava e se impunha, sempre em nome do Estadão.

Dias depois me liga Raul Martins Bastos, chefe dos correspondentes. Ele falava baixo, pausado. Era difícil entender o temido Raul e, para felicidade de todos os profissionais que o jornal tinha no Interior paulista, quem ligava diariamente eram os auxiliares dele, especialmente o Moacir e o Adhemar Oricchio.

Eram eles quem me transmitiam os pedidos dos editores. Em especial, do editor de Interior, Eduardo Martins.

Não raro, eu sugeria pautas. E como a maioria dos meus textos era publicada, fui ganhando prestígio na Redação do 5º andar da Rua Major Quedinho, 28, no centro velho da Capital.

Logo, portanto, deixei de ser “Correspondente em Marília” para ter meu nome identificado como “Correspondente Regional em Marília”.

A partir de então, meu salário subiu e passei a ganhar tanto quando um gerente de banco, segundo palavras do responsável pela agência local do Banco do Commércio e Indústria, para onde o Estadão mandava minha remuneração mensal.

Certo dia, assim que terminei de transmitir meus textos, o operador Geraldo, o mais rápido de todos, me disse, secamente: “Aguarda na linha porque o Raul quer falar com você”.

Juro que tremi, gaguejei, senti um calor anormal no rosto. Respirei fundo, apertei o telefone no ouvido esquerdo e me preparei para o inesperado, porque do Raul a gente nunca sabia o que vinha.

- Cláudio: preciso de você na cobertura dos Jogos Abertos do Interior, em Bauru. E, se você se sair bem, tenho uma vaga te esperando na sucursal de Campinas. Espera na linha que o Adhemar vai te passar os detalhes.

Nem boa noite o Raul falou. Nem no início, nem no final da conversa, que foi um monólogo puro.

Depois das explicações de Adhemar Oricchio, sempre muito claro, foi a vez de enfrentar o Mestre Irigino Camargo e dizer que ele iria perder o jovem de Adamantina que havia iniciado na carreira jornalística.

Mas, como está tarde, esta parte fica para o próximo texto, moçada.

11/3/2008 18:57:58

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